quinta-feira, setembro 28


Sem sacrifício!

De vez em quando me deparo com histórias em que o sacrifício é visto como algo nobre. Pessoas que se sacrificam por outras e sentem-se, por isso, grandiosas. Para mim, nenhuma vida é mais valiosa do que a outra. Portanto, acredito que ninguém merece o sacrifício de ninguém. Eu não estou disposta a me sacrificar por ninguém e por nenhuma causa, e dispenso qualquer sacrifício que se queira fazer em meu benefício.

É claro que nos deparamos, ao longo da vida, com situações que exigem um esforço maior e já fui - e sou - capaz de suportar momentos difíceis. Eu posso passar noites em claro ao lado do meu filho, se ele estiver doente e requerer esse tipo de cuidado, mas isso para mim não se configura como sacrifício. A partir do momento em que esse gesto ficar demasiado doloroso a ponto de me sentir mártir, eu vou procurar ajuda.

O que eu não agüento é ouvir o discurso-cobrança que sempre vem acompanhado do sacrifício: Ah, mas eu fiz tanto por ele/ela e agora é isso que recebo em troca! Ou então os lamúrios de auto-piedade: Ah! Só eu sei como é difícil cuidar dele/dela... Na verdade, não consigo me comover com essas atitudes.

Ou você está ali, ao lado, para cuidar e se solidarizar, sem ficar contabilizando a sua cota de sacrifício, ou caia fora! Porque depois é inevitável a cobrança. Quem se sacrifica sempre espera uma recompensa, nem que seja pós-morte. Como ninguém garante nada pra ninguém, eu sempre tento entender qual é a minha disposição e expectativa diante do que vai surgindo na vida para tomar minhas decisões. Como diz meu pai: Quem corre por gosto, não se cansa!

terça-feira, setembro 26


Hoje eu vou publicar um artigo escrito pelo meu irmão Guilherme, advogado que mora no Rio.

ISTO É DEMOCRACIA

Guilherme Paccola

Realmente quando ouço “vou anular meu voto”, “não vou votar” e “votarei em branco” não é de todo mal. Isto faz parte do processo político democrático brasileiro.

Os fluminenses que, segundo as pesquisas, estão declarando maior intenção de votos ao governo para um candidato do PMDB, partido que teve como destaques Anthony Garotinho e sua amada Rosinha Mateus, Orestes Quércia, Luiz Antonio Fleury Filho, entre outros, também têm como favorita ao Senado, representando o Estado do Rio de Janeiro, Jandira Feghali, do PC do B, partido este que defende a doutrina stalinista.

Li hoje (26/9), não me lembro se na FOLHA ou no ESTADÃO, que os deputados favoritos dos paulistas estão sendo Paulo Maluf e, em segundo, Clodovil, sendo que para a Presidência da República os paulistas estão confiantes no candidato do PSDB.

Li também hoje em O GLOBO que o candidato ao Senado pelo Estado de Alagoas, favorito, é nada mais, nada menos, que Fernando Collor de Mello, conhecido dos eleitores. Ele é aquele que confiscou todo o dinheiro dos brasileiros e também levou os louros do primeiro presidente a ser cassado, em decorrência de esquemas de corrupção.

Mesmo assim, como Paulo Maluf que chegou a ficar preso, com provas de desvios de dinheiro público para contas particulares em paraísos fiscais, essas pessoas voltarão ao cenário político através do voto popular e direto.

As reclamações e desilusões que virão não surtirão efeito algum, muito menos serão dignas, se assim os eleitores continuarem a votar.

Percebe-se, claramente, a incoerência e incongruência dos eleitores, o que é conseqüência do total desconhecimento político, pois os candidatos favoritos apontados nas pesquisas são totalmente opostos em seus princípios.

Conclui-se que os eleitos, necessariamente, continuarão a fazer coligações, trocas de cargos, pois pelo total desconhecimento político dos eleitores, se assim não for, a governabilidade é inviável.

Uma pena, mas a legislação eleitoral brasileira assim permite; tudo em nome da democracia. Só rindo mesmo.

sexta-feira, setembro 15

Os meus, os seus, os nossos...

Uma das coisas boas do desquite (para diversificar o vocabulário da nova geração) é a possibilidade de seu filho único ganhar um irmão sem que você tenha que engravidar. A uma certa alturinha da vida das crianças, elas começam a pedir um irmão. Eu explicava que o grande problema é que, para ele ter um irmãozinho, eu precisaria ter outro filho. Isso estava fora dos meus planos e ele nunca dirigia esse pedido ao pai dele, só a mim.

Meu filho fazia apelos dizendo que, sem irmão, ele nunca seria tio. Agradeci aos céus o fato de o Estatuto da Criança e do Adolescente não prever o direito de toda criança se tornar tio um dia. Contrargumentei que era só ele arrumar uma mulher que tivesse irmão que isso estaria resolvido.

No fundo, eu sabia que era legítimo o querer dele. Afinal, vinda de uma família grande, com seis irmãos, eu sei que é muito bom ter irmãos. E sobrinhos. (E sei também que às vezes é muito bom estar longe de todos eles).

Já crescidinha, quando a criança esquece um pouco esse assunto, eis que chega a notícia de que o pai acabou providenciando um irmão. O nascimento do bebê é tão bem-vindo pelo seu filho que você percebe que realmente ele estava precisando de um irmãozinho.

De cada encontro com o irmão, ele chega contando todas as gracinhas e manhas do bebê. E o melhor é que você também pode de vez em quando pegar no colo e dar aqueles apertões que os
bebês fofos merecem.

domingo, setembro 10

Saudades do França

A notícia da morte do França me pegou de surpresa. E me entristeceu. A notícia veio acompanhada de uma chuva fina que acinzentou a cidade. Comecei a puxar pela memória todos os meus encontros com esse grande cara, que nunca se deixou abater pelos graves problemas de saúde que sempre o acompanharam.

Eu trabalhava na Folha de Londrina quando a Patrícia Zanin, uma das amigas mais próximas do França, me mostrou um texto escrito por ele publicado em um jornalzinho. Ali, ele relatava como descobrira que tinha insuficiência renal, não lembro se na infância ou adolescência. Me chamou a atenção a leveza com que ele tratou a descoberta, contando que chegou a pensar: ah, será que é isso que falam de sangue azul? Nunca esqueci isso.

Algum tempo depois, ele também começou a trabalhar na Folha e nos tornamos amigos. A falta de espaço na redação fazia com que alguns repórteres de Economia (eu) invadissem a ilha da Cultura (ele). Era ótimo trabalhar ao lado dele. Ele tinha um senso de humor fantástico. Eu usava umas saias curtíssimas e ele brincava: Você compra suas roupas na Mirex?

Um dia veio a notícia de que o França ia passar por um transplante de rim. E ele não queria receber visitas. Era como se a saúde dele não interessasse a ninguém. Nunca ouvi nenhuma reclamação dele sobre isso. O seu retorno à redação foi muito feliz.

Ele, que amava o teatro e o cinema, viajava às vezes num final de semana pra São Paulo apenas para ver uma peça em cartaz. Quando eu comentei que achava demais ele fazer essas viagens
tão rápidas e a lugares não tão próximos, ele me explicou que nunca pôde viajar muito por causa das sessões de hemodiálise que antes precisava fazer.

Aí eu comecei a entender melhor o França. Vi que ele via a vida numa dimensão diferente de quem acredita que tem muito pela frente. Ele vivia com intensidade. Isso o tornava especial. Com seu humor sarcástico, ele era profundo em tudo.

Não lembro quanto tempo depois ele precisou passar por uma cirurgia, grave, no intestino. Fui visitá-lo no hospital. Ele precisava caminhar pelo quarto. Apoiou-se em mim e eu ia carregando o soro. Aí fiquei com uma vontade terrível de dar risada porque parecia que nós dois estávamos numa procissão, eu carregando o mastro, e comecei a rir e a cantar "A bandeira do Divino...". Ele também riu e reclamou: Carina, não me faça rir porque dói. Mas não teve muito jeito, nós rimos um bocadinho.

Fazia uns dois anos, acredito, que eu não o via. Estava acompanhando notícias dele nos jornais sobre a produção de seu filme. Isso me deixou feliz por saber que, apesar de tudo, ele continuava produzindo. Aproveitou cada momento que teve para fazer o que gostava. A imagem que me vem é sempre do França sorrindo e fazendo algum comentário engraçado. É essa imagem que me conforta.

terça-feira, setembro 5


Esses seres irracionais

Nunca me apeteceu a idéia de ter um animal doméstico. Eu tenho um certo medo de gatos e cachorros. Não gosto de pegar no colo, nem mesmo os filhotinhos, que são tão fofos. Tenho uma certa dificuldade de lidar com esses seres irracionais. Sempre acho que uma hora ou outra eles vão me atacar. Então sempre mantenho uma distância segura.

Meu filho, ao contrário, adora bichos. Não sei como ele aprendeu isso. E obviamente sempre quis ter um animalzinho em casa. Uma vez ele me convenceu de que poderíamos ao menos tentar ter um gatinho. Uma vizinha do prédio que tinha um monte de filhos e de gatos ofereceu um filhote. Lá veio o Rajadinho.

Arrumamos uma caminha na área de serviço. Eu estipulei que, de noite, o gato só podia circular pela cozinha e área de serviço. Eu tinha tanto medo que evitava ir à cozinha no meio da noite. Sei lá. Vai que ele resolvesse me atacar.

No terceiro dia, quando cheguei do trabalho, cansada, havia lá uns cocôs pra eu limpar. Aí eu desisti. Falei pro meu filho que infelizmente eu não conseguia conviver com um gato dentro de casa. Era eu ou ele. A vizinha aceitou o Rajadinho de volta; e meu filho, que já freqüentava a casa, sempre ia lá brincar com o bicho.

No Natal passado, ele ganhou um peixinho de presente. Um Beta. Pôs o nome de Frito. Peixe, eu achei que podia ser uma boa idéia. Afinal, o espaço dele já está bem delimitado, ele já sabe que é ali mesmo que faz as refeições e os cocôs, e não tem como atacar ninguém.

Nós estávamos de férias em Londrina e tínhamos que voltar pra Brasília. Antes, dar uma passadinha na casa da minha mãe no interior de São Paulo. O Frito, então, viajou de carro até a casa da minha mãe, de ônibus até São Paulo e de avião até Brasília. E se comportou muito bem. Não foi barrado no detector de metal. E, o que é melhor, não morreu.

No início eu nem lembrava que ele existia. Se deixassem comigo a incumbência de lhe dar comida, ele passava fome. Mas, com o tempo, não é que eu fui me afeiçoando ao bichinho? E ele nem é daqueles peixes bonitos, coloridos. É até sem graça. Às vezes eu até puxava um papo. Ele, sempre muito discreto, nunca emitiu um som.

Na viagem de volta a Londrina, de carro, o Frito agüentou firme os 1.200 km. Eu cuido melhor dele agora e às vezes fico pensando como é que a gente pode gostar de um peixinho... Ainda mais um desmemoriado. Meu filho descobriu na internet que o tempo de memória de um Beta é de três segundos.

Esses dias, o Frito começou a apresentar um comportamento estranho. Parou de comer. Ficava imóvel no aquário. Estava completamente macambúzio, taciturno e sorumbático, como diria o Aurélio (o Albano, meu amigo, e não o Buarque de Holanda). Será que a hora dele estava chegando? Nova pesquisa na internet informou que um Beta vive de 2 a 3 anos. Então, ele ainda tinha tempo. O que seria?

Numa loja de bichos, a moça explicou que podia ser o frio. Eu pensava que peixe nem tinha essa de sentir frio nem calor, afinal, ele nasce dentro d'água e fica molhado a vida toda. Mas achamos que era uma boa explicação. Compramos um aquecedorzinho de oito reais (quatro vezes o preço de um peixe, diria meu lado totalmente racional). E não é que o Frito voltou a ser feliz? O bichinho, coitado, estava com frio. Voltou a comer e a saracotear. E até já esqueceu que um dia passou frio.