quinta-feira, maio 24

Amor canino

De repente dei de gostar de cachorro. Logo eu, que sempre tive medo de qualquer ser quadrúpede. Eu até gostava, mas bem de longe. Tinha mais medo do que apreço. Então o melhor mesmo era manter distância. Vai que vem me morder. Mesmo de brincadeira. Não gosto das mordidas caninas de brincadeira. Até porque nunca se sabe se os cães sabem a medida da brincadeira. Às vezes pra eles é só uma mordidinha de leve e pra gente é de arrancar o dedo. Sei não. Melhor não arriscar. Primeiro foi a Pink. Ela tem uns 30 cm de comprimento com uns 15 cm de altura da cabeça. Não sei como se mede um cachorro. Mas vamos dizer que ela é bem pequena e bem mansinha. Ela nunca veio com essa história de morder de brincadeira. Aliás, acho que ela nunca deve ter mordido nada. Não. Ela morde, sim. Os brinquedinhos dela. Eu até brinco de vez em quando de jogar os brinquedinhos. Ela sai em disparada, toda feliz. Cachorro fica feliz à toa. Ela também tenta subir no meu colo. Dá até aquela choradinha pedindo colo. Mas entre gostar dela e deixar que venha ao meu colo tem uma distância grande. Eu até já deixei. Mas eu mais não deixo do que deixo. Já a Nina tem uns dentes salientes que passam a ideia de brabeza. Ela já sabe que de mim o máximo que arranca é um carinho com o pé. Ela se aproxima e fica de barriga pra cima, esperando o carinho. Fico até com pena e penso no tamanho da carência a ponto de se contentar com carinho feito com o pé. É tudo o que eu tenho pra ela. Não, eu também jogo uns pedaços de carne de vez em quando, quebrando o regime feito de ração. Nas últimas semanas, entrou mais um cachorro em minha vida. Um filhote de labrador que mora perto do meu trabalho. Quando estaciono o carro perto da casa e ele está por ali coloco a mão entre as grades do portão e afago o bicho. Incrível. Ele fica todo feliz e me lambe. E late forte quando eu vou embora. Agora, recebi a notícia de que a Xuxu, que mora junto com a Pink e a Nina, está doente. Faz meses que ela está cega e anda perdida pela casa. Agora veio o diagnóstico de câncer. Nós duas sempre mantivemos uma relação cordial de ignorância mútua. Eu a ignoro, ela me ignora. E nos damos bem assim. Mas fiquei com pena. Ela sofre e nem sabe por que sofre. Me deu uma pena imensa. E desejei que tenha uma boa morte logo. E pensei que é estranho pensar no espaço que os cachorros ocupam na vida das pessoas. Mesmo na minha, que nunca lhes dei muito espaço.

quarta-feira, maio 16

O buraco

Um carro bateu num buraco e capotou. Estava escrito no jornal. Aí fiquei pensando: como assim que o carro bate num buraco? Fui até conferir a definição de buraco: furo, orifício, pequena abertura, cavidade, cova, lacuna, falta. Como é possível bater em algo que falta? O carro deve ter caído no buraco. Ah, a não ser que o cara estivesse dirigindo enquanto jogava cartas, comprou o coringa que faltava, bateu no jogo (no buraco) e enquanto comemorava distraiu-se e capotou o carro. O repórter com certeza confundiu os buracos. Outro dia, num jogo de buraco, minha irmã, que é enfermeira, também se confundiu, comprou um coringa e soltou: – Hum! Seringa! Nós rimos. E agora ela não acredita que cometeu este ato falho. Eu e meus irmãos, que somos jogadores de buraco quase profissionais, já adotamos a seringa como sinônimo de coringa. Fora o jogo, o buraco não é sinônimo de coisa boa. Serve para cairmos dentro ou para lembrarmos daquilo ou de quem falta. Mas, tem dias, dependendo de como nos sentimos, em que tudo o que queríamos era encontrar um buraco para nos esconder.

quarta-feira, maio 2

Os bebês e as cólicas

Acabo de ler no jornal que a Anvisa cancelou o registro da funchicória, um fitoterápico recomendado para cólicas de bebês. Quem é mãe já ouviu falar desse remédio em pó, que existe há 72 anos. O motivo do cancelamento do registro é que nunca foi comprovada cientificamente sua eficácia. Nem lembro quem foi que me recomendou funchicória para o meu filho. Perguntei ao pediatra. Ele disse que eu podia usar, mas que de fato não ia resolver o problema. É engraçado como as mães, mesmo sem nenhuma garantia de sucesso, optam pelo remedinho. Vai que resolve...
Comprei o pozinho. Molhava a chupeta, enchia de pó e dava pro bebê. Na verdade, era a única maneira que ele aceitava a chupeta. As cólicas duraram os previsíveis três meses. A matéria diz que o remédio serve mais para acalmar os pais do que aliviar as cólicas. Para mim, esse motivo já demonstra a eficácia do remédio. Fico surpresa ao descobrir, no jornal, que o preparado contém um adoçante artifical, a sacarina. Acho que por isso os bebês gostam.
Dizem que o período em que o ser humano mais cresce é em seu primeiro ano de vida. Pode ser que esses doze meses concentrem também o maior número de desafios para as mães. O teste do pezinho, as vacinas, o sono, nossa, é muita coisa pra lidar.
Para vencer as cólicas, tentamos de tudo. Ao ouvir que chocolate provocava cólica, parava de comer chocolate. Não resolvia. E assim fui cortando vários itens da alimentação. Sem sucesso. Talvez as cólicas nos bebês existam para sinalizar às mães que elas não resolvem nem controlam a vida dos filhos...