sábado, julho 28

Perto e longe

Duas viagens rápidas a seguir:
uma para a terra do afeto e da alegria (Piraju)
e uma para a terra do gelo (Curitiba).

Piraju (pertinho): aniversário do meu irmão, festa familiar, presença do meu pai, casa cheia, barulho de crianças, muitas panelas no fogão, muita louça pra lavar, casa cheia, o quarto da minha mãe, colchões espalhados pela sala na hora de dormir, pilhas de cobertores, travesseiros e lençóis, carros enfileirados na garagem, casa cheia, reencontro de amigos, badaladas de sinos da igreja matriz, saudades da minha mãe.

Curitiba (lonjão): frio, frio e frio; viagem de ônibus; trabalho; cansaço; frio, frio e muito frio.

Ainda bem que existe Piraju antes de Curitiba.

Cadê esse aquecimento global que me deixa aqui tiritando de frio?

quinta-feira, julho 19

Cores da alma

(Imagem) Copyright: Pinto da Silva

Por que será que quando o dia está cinzento e chuvoso, a minha alma também se acinzenta e fica chorosa?

Eu estou desconfiada que isso não é verdade. Que é só uma coincidência. Como hoje eu gostaria de ficar quieta em casa, sob cobertas, sem falar com ninguém, nem ver TV, nem usar computador, eu fico querendo que a explicação seja o tempo. Mas se hoje estivesse ensolarado e o céu azul, quem sabe minha alma ia estar feliz e colorida, ou ainda estaria se comportando como se fizesse um dia de chuva?

Para ter essa resposta, eu teria que anotar num caderno todos os dias as condições climáticas e as condições de minha alma. Mas quando a gente está feliz a gente não está interessada em atribuir motivos à felicidade; e quando a gente está meio aquietada a gente não está com o mínimo de vontade de preencher um caderno com dados técnicos sobre o clima de fora e o de dentro.

Até porque quando a gente fosse ler o resultado geral das anotações, não ia se lembrar direito do estado de espírito. Ia apenas ler: vontade de fazer nada e de ficar quieta. Mas não ia sentir a mesma coisa. E ia pensar por que será que eu estava assim? Ia dar de ombros e achar ótimo que já tenham passado aqueles momentos, sabendo que outros virão. E pensar que se não existe estado perene de felicidade, também não existe estado perene de infelicidade.

A gente insiste em encontrar motivo: ou é falta de grana, ou é falta de alguém, ou é falta de sentido da vida. Mas essas faltas também estão presentes quando está tudo bem.

Portanto, o jeito é esperar a hora de chegar em casa, se enfiar debaixo das cobertas e falar o mínimo necessário até o sol aparecer – de verdade ou apenas na alma.

segunda-feira, julho 9

Fora de lugar

Às vezes eu me sinto assim: fora de lugar. É como se eu não me encaixasse dentro da normalidade. Justo eu que me acho tão normalzinha. Mas, às vezes, quando eu me posiciono diante de algumas situações, surge uma avalanche de críticas. Como se eu pensasse da forma mais inadequada do mundo. Aí eu me sinto a própria inadequada. Talvez seja essa a intenção. Quando alguém pensa diferente, deixe bem claro que ele pensa errado. Logo vai se sentir inadequado. E, quem sabe, cale sua boca para sempre.

Não estou me referindo a críticas e questionamentos que te fazem refletir melhor sobre o assunto, o que acho bastante saudável. Estou falando de críticas sem fundamento e de julgamentos prévios.

Estou lendo um livro sobre a China, e a autora – uma portuguesa – afirma que os chineses nunca emitem opinião sobre nada por causa dos tempos de pensamento único. É melhor se calar do que levar bordoada. Na época de Mao Tse Tung, a população era estimulada a criticar a Revolução. No entanto, quem abria a boca acabava perdendo a língua, literalmente.

E não é apenas verbalmente que eu me posiciono. Minha atitude também costuma contrariar muitas vezes a lógica da normalidade. Eu até prevejo que vou sofrer conseqüências. Mas agir de acordo com minhas convicções é mais forte do que eu. E aí eu agüento as conseqüências.

Por outro lado, acho que sou mais tolerante com quem pensa ou age diferente de mim. Será? Posso até ser crítica, mas raramente levo pro lado pessoal, desqualificando a pessoa por seu modo de pensar.

Ou seja, eu sou mesmo ÓTIMA. (Nada como ter um blog e fazer auto-elogios pra melhorar o meu humor).

domingo, julho 8

Trabalho Infantil 2

O tema Trabalho Infantil é bastante polêmico. Culturalmente, a sociedade brasileira acredita que trabalhar desde cedo acaba contribuindo para que a pessoa seja mais responsável e tudo o mais. Abaixo transcrevo o texto do blog do Aguinaldo, já com as minhas respostas às questões apresentadas por ele (na verdade, copiei esta idéia do blog dele mesmo...)

Aguinaldo Pavão:
A Folha de Londrina publica hoje um belo artigo da Carina Paccola contra o trabalho infantil. Primeiro gostaria de dizer que me agrada muito ver a Carina polemizando contra a ilustre promotora da Vara da Infância e Juventude de Londrina. Eu li a entrevista dela - que é objeto de crítica da Carina – e a achei confusa em certos momentos. Porém, não consigo perceber o exato alcance da tese defendida pela Carina. Atualmente, é preciso ter 14 anos para ser aprendiz e 16 para ser contratado com registro em carteira. Antes era preciso 12 para aprendiz e 14 para registro. Carina também é contra a atual legislação? Ou é contra apenas o retorno à lei antiga? Bom, isso não ficou claro.
Aguinaldo, eu concordo com a lei do Menor Aprendiz, a partir dos 14 anos, como é atualmente. E, mesmo assim, eu vejo essa legislação como uma tentativa de resposta à grave condição social em que se encontram muitos adolescentes brasileiros. Na minha opinião, o ideal seria que crianças e adolescentes - e também jovens - tivessem condições de se dedicar aos estudos até que terminassem sua educação formal. A não ser, é claro, que eles quisessem (os jovens, diga-se). Eu comecei a trabalhar aos 21-22 anos, recém-formada, como jornalista. E nem por isso sou menos responsável do que os que começaram aos 14, ou 12. Ou seja, eu não concordo com esse papo de que se começar mais cedo a trabalhar, melhor será para a pessoa. Aprender limites e responsabilidades começa em casa, com os pais, e também na escola.
Agora, independentemente disso, eu pergunto: por que uma lei deveria decidir isso? Por que o Estado tem de interferir nesses assuntos? Já não é suficiente que se exija compatibilidade do trabalho com educação e lazer? Um dos pontos que a promotora toca com razão é o impedimento legal de um pai ensinar o ofício a seu filho. Ora, não consigo assimilar tamanha ilegitimidade da ação do Estado.
Eu sei que você defende a menor intervenção do Estado em todas as questões. Mas o Brasil é um país extremamente legalista. Esta é a nossa tradição. Só vale o que está escrito na lei. Esta semana participei de um evento sobre resíduos sólidos e um dos palestrantes, falando sobre uma lei que deve ser enviada ao Congresso, falava que de um assunto que já estava regulamentado por um conselho, mas as indústrias brasileiras teimavam em não colocar em prática porque ainda não era lei. Ou seja, infelizmente, se o Estado não me diz como agir eu vou agir da pior maneira possível - é o que vale para muitos segmentos da sociedade.
E a lei que proíbe o trabalho infantil é para coibir abusos e explorações. Ora, um pai pode ensinar um ofício a seu filho, desde que essa criança ou adolescente estude, tenha tempo livre para brincar, para fazer tarefas escolares e tudo o mais que as crianças têm direito. Ou seja, a criança até pode aprender o ofício, mas não como obrigação de cumprimento de horário.


Carina argumenta, contra a promotora, que o pensamento dela valeria apenas para crianças pobres e não para filhos das classes média e alta. Mas qual o problema nisso? Certamente que não se pensa numa lei que discrimine pobres e ricos. Mas o ponto é que se a reclamação da Carina fosse procedente então não teríamos mais condições de determinar uma idade para início legal em atividades laborais. Com efeito, um pobre de 21 anos provavelmente terá mais necessidade de trabalhar do que um rico com a mesma idade. Um rico com 21 anos pode estar na Universidade, dedicando-se integralmente aos estudos. O pobre não. Então vamos impedir isso?
É o seguinte, a classe média não vai mandar seus filhos de 12 anos para o trabalho. Portanto, a defesa do trabalho precoce é para os filhos das famílias pobres. Ora, se eu considero que o trabalho é prejudicial ao estudo e ao desenvolvimento do meu filho, que tem 12 anos, por que o filho do pobre pode trabalhar? Aos 21, ou aos 18, já não estamos mais falando de crianças, então a conversa é outra.
Vou transcrever um trecho de um documento produzido pela OIT e pela ANDI, com o qual concordo integralmente: "É a família que deve amparar a criança e não o contrário. Quando a família se torna incapaz de cumprir essa obrigação, cabe ao Estado apoiá-la, não às crianças. O custo de alçar uma criança ao papel de 'arrimo de família' é expô-la a danos físicos, intelectuais e emocionais. É inaceitável, não só para as crianças, como para o conjunto da sociedade, pois ao privá-las de uma infância digna, de escola e preparação profissional, se reduz a capacidade dos recursos humanos que poderiam impulsionar o desenvolvimento do país no futuro (...)"


Carina também afirma: “Acredito que, em vez de a sociedade se mobilizar para mudar a legislação, por que então não mobilizar a sociedade para que sejam assegurados às todas as crianças os outros direitos - ensino de qualidade, esportes, lazer, cultura, alimentação adequada?”. Mas isso, Carina, não é incompatível com o trabalho infantil. A sociedade pode se mobilizar pelas duas coisas.
Aguinaldo, se uma criança trabalha, como é que ela pode usufruir de esportes, lazer e cultura? Se ela estudar no período da manhã e trabalhar no período da tarde (na melhor das hipóteses porque é bem provável que ela irá abandonar os estudos), provavelmente à noite ela estará bem cansada. Ela não vai ter tempo nem disposição para fazer tarefas, brincar, ver um filme, passear e etc.
Sem falar que o Brasil tem hoje milhares de crianças trabalhando em pedreiras, carvoarias, nas lavouras de cana, vendendo panos de prato nos bares à noite (o que é muito comum em Brasília, por exemplo), vendendo doces nos sinaleiros, como domésticas em troca de comida e pouso. É como eu digo no meu artigo, se não há emprego para jovens, que tipo de trabalho existe para as crianças?
Eu defendo que o Estado tem o dever de proibir esse tipo de exploração de mão-de-obra infantil. Até porque essa conversa de que é melhor trabalhar do que roubar (como se o roubo fosse a única alternativa que resta às crianças pobres) ainda justifica que a classe média empregue as crianças, com um salário baixíssimo, afinal, é um favor que se está fazendo à criança.

sexta-feira, julho 6

Trabalho Infantil

Abaixo reproduzo artigo escrito por mim e publicado na Folha de Londrina de ontem, dia 5. É uma constestação a uma entrevista da promotora da Vara da Infância de Londrina, Édina Maria de Paula, sobre trabalho infantil. A entrevista da promotora pode ser lida no endereço (eu não consegui fazer o link): http://www.bonde.com.br/folha/folhad.php?id=670LINKCHMdt=20070703

O professor de Filosofia da UEL Aguinaldo Pavão escreveu um post em seu blog comentando o meu artigo (e contestando algumas posições minhas). O endereço do blog dele é http://agguinaldopavao.blogspot.com/. Eu pretendo depois responder às questões apresentadas por ele, nos meus comentários.

A coluna Informe Folha, da edição de hoje (dia 6), traz algumas notas de apoio à opinião da promotora. E uma especialmente dedicada a mim (intitulada Preconceito Ideológico) que, na minha opinião, faz um julgamento leviano acerca dos motivos que me levam a ser contra o trabalho infantil. Acho que o debate deveria ser mais sério. Nos comentários, depois, vou responder ao Aguinaldo e espero expor melhor minha opinião.


Não ao trabalho infantil (artigo publicado na Folha de Londrina, dia 5)

Carina Paccola
Entendo que a promotora da Vara da Infância e Juventude de Londrina, Édina Maria de Paula, enfrente em seu cotidiano situações que a levem a pensar numa solução rápida para os problemas da infância brasileira. Mas tenho que discordar de sua posição que defende que crianças a partir dos 12 anos não só possam como devam trabalhar (‘‘Deixe o adolescente trabalhar’’, Opinião, pág. 3, 3/7).

Parece-me que esse pensamento só vale para as crianças pobres, que deveriam ajudar no orçamento doméstico. Ou esse pensamento também vale para os filhos de classe média e classe alta?

Não é à toa que o trabalho infantil é mais intenso em países mais pobres e nas regiões também mais pobres no Brasil.

A Organização Internacional do Trabalho (OIT) e outros organismos nacionais e internacionais mostram que o trabalho infantil traz prejuízo ao rendimento escolar, à saúde e ao convívio familiar e social da criança.

Para a promotora, a legislação parte de uma situação ideal em que crianças teriam atendidos seus plenos direitos. Como não é este o caso do Brasil, a solução apontada por ela é que se mude a legislação e as crianças possam trabalhar - e assim ficar longe das ruas, das drogas, da violência.

Acredito que, em vez de a sociedade se mobilizar para mudar a legislação, por que então não mobilizar a sociedade para que sejam assegurados às todas as crianças os outros direitos - ensino de qualidade, esportes, lazer, cultura, alimentação adequada?

Discordo também da afirmação da promotora que associa a proibição do trabalho infantil ao aumento da violência no País. A pesquisa Mapa da Violência, coordenada pela Unesco, mostra que os jovens são as grandes vítimas da violência no País. Não se pode culpabilizá-los pelo crescimento da violência.

O Dieese (Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Sócio-Econômicos) também já divulgou que o desemprego entre os jovens é pelo menos duas vezes maior do que entre os adultos. Ou seja, se não há empregos dignos para os jovens, que tipo de trabalho será destinado a crianças a partir dos 12 anos?

O país deveria se mobilizar para garantir condições para o pleno desenvolvimento das crianças, sem que elas tenham que assumir responsabilidades de adultos numa fase em que elas ainda têm muito que brincar e aprender.

CARINA PACCOLA é jornalista em Londrina

terça-feira, julho 3

Quanta água!

Aos 17 anos, fui morar num pensionato em Bauru para fazer o terceiro colegial. Minha irmã, de 16, já morava lá. Mesmo assim, eu chorava de saudades de casa – distante cerca de 150 km. A cada 15 dias, ia para a casa dos meus pais.

No início do ano seguinte, meu irmão me trouxe a Londrina para prestar vestibular. Fiquei na república da Isa, da minha cidade, e que também ia fazer vestibular. Quando ele virou as costas e me deixou sozinha, me pus a chorar. Já na universidade, adorei Londrina e nem chorava mais de saudades. As idas para a casa dos meus pais eram mais espaçadas.

Sete anos depois, fui pra São Paulo trabalhar num grande jornal. Era um sonho. Mas toda noite, quando voltava pra casa, eu me debulhava em lágrimas. O apartamento ainda não tinha telefone. Eu descia à rua Jaguaribe para ligar de orelhão. E chorava.

Uma noite, a caminho da casa de uma amiga de infância, contei pro taxista que tinha saudades de Londrina. E caí no choro. Ele me aconselhou a voltar, o que acabei fazendo meses depois.

Aí passou muito tempo. Meu filho nasceu, cresceu. Vieram amores. Sumiram amores. E eu decidi me mudar pra Brasília. Enquanto ainda não tinha telefone, falava com minha mãe pelo orelhão. E chorava. Chorei meses. Até que voltei pra Londrina. Será que é impossível desvencilhar-se de Londrina a seco?