segunda-feira, agosto 10

O vento

O vento soprou tanto, tão forte e tão ruidoso, que me perguntei o que ele queria tanto afastar do céu. Tenho medo de chuvas e ventos fortes. Mesmo protegida, não consigo dormir tranqüila. Acordo a todo instante, vou conferir pela janela se está tudo em ordem do lado de fora. Vejo as árvores balançando. Nenhuma alma viva pela rua.

Quando o dia clareia, parece que tive pesadelos a noite toda. Confiro novamente a janela. Vejo que o cavalinho vermelho do play-ground foi parar na quadra de esportes. Fico com dó do cavalinho. Separou-se dos irmãos e está ali, jogado, sozinho.

Na área de serviço, recolho as toalhas de banho esticadas no varal. Todas sequinhas. Apanharam do vento a noite toda. Recolho uma por uma e penso o que foi que o vento tanto gritou durante a noite. Imagino que as palavras do vento estão escondidas na trama das toalhas e nunca entenderei seu significado.

Fico pensando o que a natureza pode querer me dizer: que eu varra com a força dos ventos o que me faz mal? Seja lá o que for, a única mensagem compreensível é que está muito frio lá fora e é melhor eu me agasalhar

segunda-feira, agosto 3

Machucados



De vez em quando eu levo uns tombos – literalmente. Não sei o que me acontece que eu caio, prancho no chão. E levanto rapidinho. Claro que sempre tem gente por perto para eu morrer de vergonha. Dias desses levei um tombaço, machuquei o cotovelo. Fez um machucadão mesmo, desses de criar casquinha e tudo. Isso porque eu estava com um casaco.
Meio chorosa, mostrei o machucado pro meu filho. Ele não deu muita importância e perguntou: – Mãe, você nunca teve machucado?
Acho que eu tinha esquecido como é. A minha mãe falava que quando começa a coçar é porque está sarando. Quando a gente cresce, os machucados deixam de ser visíveis e doem por dentro. Demoram mais a cicatrizar e nem dá para mostrar para os outros. Não há band-aid que resolva, só o tempo.

Nada a ver com meus machucados, mas acabei lembrando de um filme chileno, Machuca, que retrata a amizade entre dois meninos na década de 70, bem na transição entre o governo de Allende e a ditadura. Um menino rico e um pobre que viram grandes amigos. O filme revela as contradições com que convivemos no dia-a-dia. Ah, essas contradições também me machucam.