sexta-feira, novembro 9

Leitura dinâmica

O rapaz me liga oferecendo um curso de leitura dinâmica. Pergunta se gosto de ler. Eu gosto. Pergunta se eu gostaria de ter um rendimento melhor na minha leitura – e dá um exemplo do qual já não me lembro (mas fala sobre ler um certo número de páginas em um certo período de tempo). Fico admirada da rapidez. Ele então quer marcar 20 minutos pra fazer um diagnóstico de minha forma de ler para, então, oferecer o tal curso. Eu digo que não quero. Ele muda o tom. De simpático, passa a ser ríspido. E diz: “Bem, eu estou oferecendo um diagnóstico DE GRAÇA, mas se você não tem 20 MINUTOS para isso, então fica difícil”. Eu agradeço e terminamos a conversa. Sinceramente, não quero melhorar minha produtividade na leitura. Caramba! A leitura é uma coisas que faço com muito prazer – e o cara quer otimizar meu tempo na leitura. Ah, me deixe em paz! Eu queria ter mais tempo para ler, mas não ler mais rápido. Era o que faltava agora: querem tecnologizar a leitura.

quarta-feira, agosto 29

Sortes e azares!

Nós não temos nenhum controle sobre as forças da natureza nem domínio total sobre nossa vida e as vidas alheias. Mesmo assim a gente pensa, “torce”, para que aconteçam algumas coisas e para evitar outras em nossas vidas. Meu filho, por exemplo, não gosta de me ver por perto quando o Palmeiras está jogando porque fala que sou “pé frio”. Já fui culpada por derrotas e gols sofridos pelo Verdão, que também é meu time. Dou risada e falo: Quem me dera ter tanto poder a ponto de influenciar o resultado de um jogo.

Lembro de uma Copa do Mundo em que o Brasil estava decidindo um jogo nos pênaltis e eu estava na redação da Folha de Londrina. Na hora de os nossos jogadores baterem o pênalti, algumas pessoas evangélicas começavam: “Oh, Senhor, ajudai esse jogador. Amém, Senhor. Aleluia, Senhor!” Isso me irritava e eu provocava: E se houver, neste momento, várias pessoas rezando o contrário: “Oh, Senhor, abençoa o goleiro e faz com que ele defenda essa pênalti”. Quem é que Deus vai atender?

Quando eu trabalhava em Santo Antônio da Platina, na sucursal da TV Cidade, eu não gostava nada nadinha de cobrir futebol. Uma vez, deve ter sido em 1989, a abertura do Campeonato Paranaense ia ser em Santo Antônio com um jogo entre o Platinense e algum time da capital. Eu não tinha escolha. Tinha que estar lá no estádio, à noite, e trabalhar. Eu estava meio inconformada com isso e, desde cedo, ficava pensando: O que poderia acontecer para que o tal jogo não acontecesse? Durante o dia, em vários momentos, eu pensava: Ah, o que poderia acontecer, hein?

Então, estádio cheio e iluminado, teve início a partida. E eu lá, contrariada. Lá pelas tantas, bum, houve uma queda de energia elétrica no estádio e o jogo foi paralisado. Eu, internamente, sorri. Alguns minutos depois, a luz voltou e recomeçou o jogo. Mas durou pouco. Novamente a luz caiu e foram mais de 30 minutos no escuro até os organizadores decidirem cancelar a partida, para minha felicidade.

Lembrei dessas histórias porque já começo a me sentir culpada pelo veranico que está fazendo neste Inverno. Eu adoro o calor e detesto o frio. Então, fico extremamente feliz com este Inverno que marca temperaturas entre os 20 e 30 graus. Fico toda feliz. E eu não me importo com o tempo seco. É o clima de Brasília, que sempre me agradou. Tô começando a achar que meu filho tem razão (rs!)...

quinta-feira, junho 28

Sobre o Pacifico

sobre o Pacifico, meu coração está em paz!
o menino dorme ao meu lado
o navio desliza
pela janela vejo as águas geladas
em movimentos suaves
o Sol vem ao meu encontro
ilumina meu rosto
e faz brilhar as águas pacificas
as ilhas se aproximam
e depois seguem, cada vez menores
O mosquito está do lado errado
desprotegido
Eu protejo o meu coração
quando vejo o menino ao lado
O Sol só vem confirmar
que está tudo em paz

domingo, junho 17

A nobreza dos jumentos


Tenho dificuldade de me livrar de jornais não lidos. Talvez por ser jornalista, parece que não quero perder nenhuma notícia publicada. Ou será que é uma tentativa de valorizar o tempo perdido por algum colega repórter que se debruçou naquelas linhas? De qualquer forma, tenho por hábito ler jornal vencido. Como isso não se configura em transtorno obsessivo compulsivo, consigo perceber de quando em quando que não darei conta daquela pilha que só cresce e todos vão para o lixo de uma vez só. Mas ao meu lado sempre sobra um ou outro para eu ao menos passar os olhos antes de irem para as mãos dos recicladores.

Quando me deparo com algum artigo ou reportagem primorosa fico feliz por não ter me desfeito daquele papel velho. Hoje, peguei em mãos o Estadão de domingo passado (10 de junho) e me detive no título “Ao jegue, com carinho”, do jornalista francês Gilles Lapouge. E ele fala sobre os jumentos. De uma maneira tão bela e carinhosa que passei a amar os jumentos, tão desprezados pela humanidade.

“Está na hora de lembrar dos jumentos” – começa ele, exaltando a boniteza, força e resignação desses animais que servem só pra servir os homens. “O jumento não é só corajoso e útil: também tem caráter. Apesar de sua cortesia e indulgência com relação às loucuras e vilanias dos homens, jamais transige em questão de princípios”.

Em tempos de extrema valorização da esperteza, talvez o jumento tenha mesmo algo a nos ensinar. “O jumento sabe de tudo. Ele não trota nas mesmas paisagens que nós. Apenas aparenta compartilhar nossos caminhos, quando na realidade está em outro lugar, vem de outro lugar, vai para outro lugar. Ele atravessa educadamente nossa geografia sem fazer ruído para não nos perturbar, mas na verdade não caminha no mesmo passo que nós. Somente os poetas compreenderam a nobreza do jumento”.

Em outro trecho escreve que, com o passar dos milênios, o jumento começa a entender que as coisas não vão muito bem para ele, mas não se revolta. “Sua tática é sutil. O cérebro humano não a alcança. O jumento é submisso e glorioso ao mesmo tempo, resignado e irredutível, escravo e soberano, vencido e vencedor. (...) Encontrou obstáculos e os contornou. Ele se salvou do tempo. Sobre seus belos cascos, trota nas pradarias onde as horas não soam.
Se os espancamos, ele nos olha com um olhar incrédulo e belo. Não fica com raiva. Tem pena de nós. Não nos culpa, só nos observa. Ele gostaria de nos ajudar a ser menos vingativos. E nos consola de nossas maldades. ‘Não se preocupe’, parece dizer, arreganhando os beiços, ‘não é sua culpa. Você é assim, mas isso vai passar. É um mau momento, uma má eternidade. Depois, você vai ver, tudo será melhor’.

Nossa, fiquei comovida ao ser consolada por um jumento!
Texto do Gilles Lapouge:
http://www.estadao.com.br/noticias/geral,ao-jegue-com-carinho,884541,0.htm

quarta-feira, junho 13

Escuridão


No escuro, vem o silêncio. E a desesperança. A noite é longa, a escuridão realça a dor. No silêncio, dá pra ouvir com nitidez sua própria voz contando a sua história, revelando aquilo que você não queria saber. É melhor afastar a ideia de acender a luz porque agora nada vai iluminar seu caminho. Guarde sua energia porque a noite será longa. Você já passou por noites escuras assim, já sentiu dores semelhantes. O único alento é lembrar que sempre amanhece. Mesmo que esta noite dure várias noites, logo amanhece...

quinta-feira, maio 24

Amor canino

De repente dei de gostar de cachorro. Logo eu, que sempre tive medo de qualquer ser quadrúpede. Eu até gostava, mas bem de longe. Tinha mais medo do que apreço. Então o melhor mesmo era manter distância. Vai que vem me morder. Mesmo de brincadeira. Não gosto das mordidas caninas de brincadeira. Até porque nunca se sabe se os cães sabem a medida da brincadeira. Às vezes pra eles é só uma mordidinha de leve e pra gente é de arrancar o dedo. Sei não. Melhor não arriscar. Primeiro foi a Pink. Ela tem uns 30 cm de comprimento com uns 15 cm de altura da cabeça. Não sei como se mede um cachorro. Mas vamos dizer que ela é bem pequena e bem mansinha. Ela nunca veio com essa história de morder de brincadeira. Aliás, acho que ela nunca deve ter mordido nada. Não. Ela morde, sim. Os brinquedinhos dela. Eu até brinco de vez em quando de jogar os brinquedinhos. Ela sai em disparada, toda feliz. Cachorro fica feliz à toa. Ela também tenta subir no meu colo. Dá até aquela choradinha pedindo colo. Mas entre gostar dela e deixar que venha ao meu colo tem uma distância grande. Eu até já deixei. Mas eu mais não deixo do que deixo. Já a Nina tem uns dentes salientes que passam a ideia de brabeza. Ela já sabe que de mim o máximo que arranca é um carinho com o pé. Ela se aproxima e fica de barriga pra cima, esperando o carinho. Fico até com pena e penso no tamanho da carência a ponto de se contentar com carinho feito com o pé. É tudo o que eu tenho pra ela. Não, eu também jogo uns pedaços de carne de vez em quando, quebrando o regime feito de ração. Nas últimas semanas, entrou mais um cachorro em minha vida. Um filhote de labrador que mora perto do meu trabalho. Quando estaciono o carro perto da casa e ele está por ali coloco a mão entre as grades do portão e afago o bicho. Incrível. Ele fica todo feliz e me lambe. E late forte quando eu vou embora. Agora, recebi a notícia de que a Xuxu, que mora junto com a Pink e a Nina, está doente. Faz meses que ela está cega e anda perdida pela casa. Agora veio o diagnóstico de câncer. Nós duas sempre mantivemos uma relação cordial de ignorância mútua. Eu a ignoro, ela me ignora. E nos damos bem assim. Mas fiquei com pena. Ela sofre e nem sabe por que sofre. Me deu uma pena imensa. E desejei que tenha uma boa morte logo. E pensei que é estranho pensar no espaço que os cachorros ocupam na vida das pessoas. Mesmo na minha, que nunca lhes dei muito espaço.

quarta-feira, maio 16

O buraco

Um carro bateu num buraco e capotou. Estava escrito no jornal. Aí fiquei pensando: como assim que o carro bate num buraco? Fui até conferir a definição de buraco: furo, orifício, pequena abertura, cavidade, cova, lacuna, falta. Como é possível bater em algo que falta? O carro deve ter caído no buraco. Ah, a não ser que o cara estivesse dirigindo enquanto jogava cartas, comprou o coringa que faltava, bateu no jogo (no buraco) e enquanto comemorava distraiu-se e capotou o carro. O repórter com certeza confundiu os buracos. Outro dia, num jogo de buraco, minha irmã, que é enfermeira, também se confundiu, comprou um coringa e soltou: – Hum! Seringa! Nós rimos. E agora ela não acredita que cometeu este ato falho. Eu e meus irmãos, que somos jogadores de buraco quase profissionais, já adotamos a seringa como sinônimo de coringa. Fora o jogo, o buraco não é sinônimo de coisa boa. Serve para cairmos dentro ou para lembrarmos daquilo ou de quem falta. Mas, tem dias, dependendo de como nos sentimos, em que tudo o que queríamos era encontrar um buraco para nos esconder.

quarta-feira, maio 2

Os bebês e as cólicas

Acabo de ler no jornal que a Anvisa cancelou o registro da funchicória, um fitoterápico recomendado para cólicas de bebês. Quem é mãe já ouviu falar desse remédio em pó, que existe há 72 anos. O motivo do cancelamento do registro é que nunca foi comprovada cientificamente sua eficácia. Nem lembro quem foi que me recomendou funchicória para o meu filho. Perguntei ao pediatra. Ele disse que eu podia usar, mas que de fato não ia resolver o problema. É engraçado como as mães, mesmo sem nenhuma garantia de sucesso, optam pelo remedinho. Vai que resolve...
Comprei o pozinho. Molhava a chupeta, enchia de pó e dava pro bebê. Na verdade, era a única maneira que ele aceitava a chupeta. As cólicas duraram os previsíveis três meses. A matéria diz que o remédio serve mais para acalmar os pais do que aliviar as cólicas. Para mim, esse motivo já demonstra a eficácia do remédio. Fico surpresa ao descobrir, no jornal, que o preparado contém um adoçante artifical, a sacarina. Acho que por isso os bebês gostam.
Dizem que o período em que o ser humano mais cresce é em seu primeiro ano de vida. Pode ser que esses doze meses concentrem também o maior número de desafios para as mães. O teste do pezinho, as vacinas, o sono, nossa, é muita coisa pra lidar.
Para vencer as cólicas, tentamos de tudo. Ao ouvir que chocolate provocava cólica, parava de comer chocolate. Não resolvia. E assim fui cortando vários itens da alimentação. Sem sucesso. Talvez as cólicas nos bebês existam para sinalizar às mães que elas não resolvem nem controlam a vida dos filhos...

sexta-feira, abril 27

Hora do almoço

Com o horário apertado para almoçar, assim que viro na rua de casa, já vejo que tem um carro atrapalhando a entrada da garagem do prédio onde moro. Como moro no centro, isso é bastante comum. Geralmente, a seta ligada e uma buzinadinha resolvem o problema. Hoje, havia um fusquinha. Um senhor, em pé do lado de fora do carro, disse que era para eu esperar um pouco. Fiz uma cara de “Fazer o quê, né?” e aguardei. Ele gesticulava dizendo que as pessoas iam voltar logo. Eu respondi com um gesto de que queria entrar. E perguntei por que ele não ia um pouco pra frente que eu conseguiria entrar. Ele me disse, como se estivesse jogando praga: – A senhora vai envelhecer um dia! Eu respondi: - O senhor também. Aí ele fez cara de bravo. Eu retruquei – Minha hora de almoço é apertada. O senhor não sabe que não pode parar em frente a garagem?
Ele veio até minha porta, pediu desculpas e disse que não tinha um tostão pra parar na zona azul. Sorri, e disse que ele estava desculpado e que eu esperaria ali, então. Dali a pouco chegaram as pessoas que ele esperava: dois velhinhos capengando. Fiquei com pena e sorri. Os velhinhos entraram na maior vagareza. Mas a minha pressa já tinha partido. O motorista veio novamente à minha porta e pediu desculpas de novo. Eu disse que estava tudo bem, eu é que pedia desculpas por ter ficado brava. Eles saíram. Entrei na garagem sorrindo e pensando que eu queria me chamar gentileza e não brabeza.

quarta-feira, abril 25

Inadequações

Ele entrou na sala falando alto. Irritantemente alto. Nossa, doeram os ouvidos. Notei, então, que o que ele queria era chamar a atenção da mocinha nova, tão bonita, tão doce, tão meiga. E tão alheia a ele. Cada palavra que saía de sua boca reverberava forte em meus ouvidos. Primeiro, analisei o conteúdo. Eram palavras sem nexo. De um assunto que não interessava a ninguém na sala. Muito menos à mocinha. Porque na verdade as palavras dele não exprimiam o que estava em seu coração. Eram significantes sem significados. Depois pensei que o tom tão elevado era pra mostrar a potência de sua voz. Voz grave. Palavras bem articuladas. Ele continuava falando e ela não lhe deu a mínima. Ele queria que ela o achasse o máximo. E ela não lhe dirigiu um mínimo olhar, nem um tímido oi. Nada. Talvez tenha sentido raiva, assim como eu, por termos nosso silêncio e concentração invadidos por aquela explosão de voz e potência e vazio. Diante da hostilidade dela, minha raiva transformou-se em compaixão. Acho que uma compaixão por mim mesma. Por todas as vezes em que elevei o tom para me mostrar o máximo, e eu era o mínimo. E lembrei da triste história do moço que levou um bombom para a menina mais linda da sala, que ele achava o máximo, e ela não lhe deu a mínima. Nem se lembrou de levar o bombom embora.

sábado, março 24

Óculos escuros

Desde que descobrira que o marido tinha um caso com uma aluna de 16 anos entrara em desespero. Primeiro pensou que era um pesadelo. Como assim? Ele saindo com uma garota de 16? Os dois estavam casados havia 18, mesma idade da filha mais velha. Ela havia se casado grávida. Os dois construíram muita coisa juntos. Tinham vencido na vida. Uma vida modesta, mas honesta. Tinham mais dois filhos, uma de 12 e um de 10. E agora essa? Depois de chorar baldes e baldes, viu que precisava fazer alguma coisa. Já tinha posto ele pra fora, mas precisava fazer alguma coisa a mais. Não sabia bem o quê. Dias e dias pensando em vingança. Aquilo não ia ficar assim. Uma manhã, olhou-se no espelho e viu as olheiras escuras. A única expressão no rosto era de dor. Dor e, lá no fundo, ódio. Queria se livrar daquele pesadelo. Pensou então em comprar uma arma. Sim, iria acabar com a vida dele. Com a menina não faria nada. Era quase uma criança. Ele, sim, podia ter evitado a situação. E agora merecia morrer. Bateu a porta da rua e pisou firme na calçada. Sabia onde encontrar uma arma. Um conhecido trazia muamba do Paraguai, inclusive armas. Ela diria que era pra se sentir mais segura. Afinal, depois que o marido fora posto pra fora, quase não dormia de medo de ladrão. Caminhava pela rua quando se sentiu atraída por uma vitrine. Era uma ótica, com vários óculos em exposição. Resolveu entrar. Passou um bom tempo experimentando diferentes modelos. Encontrou um par tão bonito. Combinava com o rosto dela e com a cor dos cabelos. Quando se viu no espelho, as olheiras haviam sumido atrás das lentes escuras. O preço era o mesmo que o de uma arma. Pagou à vista. Colocou no rosto e voltou para casa se sentindo bonita.

quinta-feira, março 1

Destroços

O desafio era criar um objeto novo. Não que o objeto não existisse; afinal, não sou assim tão inventiva. Era recriar o já criado. Primeiro, criei na minha cabeça. Surgiram formas e cores, mas ainda incompletas. Precisava pensar o todo. Como diria o Jack, comecei por partes. No meio das partes, surgiu o quase todo. Conforme avançava, o desenho se definia. Trabalhei duro. Já pronto, faltava o acabamento. Juntei duas experiências diferentes com a minha inexperiência. Minha inexperiência e o desconhecimento de físicas e químicas falaram mais alto. O resultado foi desastroso. Foi a destruição do que havia criado. Soterrei minha arte. Agora, teria que virar escultora. Vieram lágrimas e desespero. Só me restou esfolar os dedos e me dobrar diante do novo desafio. Não sei se virei escultora ou arqueóloga. Não tenho cinzel, mas tenho que descobrir o quebra-cabeças que eu mesma montei. Cada movimento pra fora gera um movimento pra dentro. Fora, já sei o desenho que vou encontrar. Dentro, é um caminho sem fim.

segunda-feira, janeiro 16

Borboletas Negras

O filme “Borboletas Negras”, em cartaz no Cine Com-Tour, conta a vida da poeta sul-africana Ingrid Jonker, interpretada pela atriz Carice van Houten – eu não conhecia e é maravilhosa! Eu também não conhecia esta poeta.

Branca, linda (pelo menos no filme) e com uma sensibilidade à flor da pele, ela é filha de um poderoso defensor do Apartheid. A relação entre os dois é péssima – ela sofre muito diante de cada situação de racismo que presencia, e ele – não por acaso – usa um bigodinho bem hitleriano... O conflito entre eles não é apenas ideológico. Ela e a irmã foram abandonadas pelo pai na infância. Foram resgatadas por ele com a morte da avó materna com quem viviam. Mas a rejeição com que ele a trata é gritante.

Ingrid vive uma relação intensa com o escritor Jack Cope (interpretado por Liam Cunningham). Ele é super cuidadoso com ela, mas não dá conta do furacão que a move.
Ingrid escreve e escreve muito. Mas com sangue. Suas palavras são para expressar toda sua dor. Com a escrita ela tenta dar conta da vida. Infelizmente, o descuido do pai com ela é determinante para o seu final trágico. Vale a pena conferir o filme!