


A decisão do STF foi um retrocesso para o país. Alguns amigos tentam me consolar dizendo que eu sou talentosa, que sou ótima profissional e que não preciso me preocupar. Sou formada há 21 anos, tenho pelo menos 15 anos de experiência em jornalismo diário, sou concursada numa empresa de economia mista e, sinceramente, não estou nem um pouco preocupada com o meu caso em particular. E, se eu sou uma profissional competente, eu devo à minha formação universitária.
Em 1991, quando concorri a uma vaga na Folha de S. Paulo, depois de uma peneirada, sobramos eu e um engenheiro (
afinal a Folha sempre foi a precursora na luta contra o diploma, algo que eu repudio. E eu gostaria de saber, o que a Folha nunca divulga, é qual o percentual de jornalistas formados e não-formados dentro da redação do jornalóide paulistano. Eu imagino que os formados ganhem de goleada). Na época eu estava formada fazia três anos e tinha três anos de trabalho em jornal diário. É óbvio que eu passei no concurso da Folha e não o engenheiro.
É claro que os profissionais que passam por uma faculdade de jornalismo são melhor preparados do que qualquer outro profissional com formação em outra área. Eu desafio qualquer profissional (engenheiro, advogado, médico, professor de filosofia, de letras, de história, do escambau) a fazer um texto jornalístico. O meu vai ficar melhor. Não estou falando de artigo opinativo (cometo a redundância porque nem todos sabem que artigos são opinativos). E a matéria pode ser na área de atuação desse profissional. E é claro que todos esses profissionais têm espaço nos veículos de comunicação para expressarem suas opiniões. Isso já contraria a tese de que o diploma impede a liberdade de expressão.
Fico muito irritada com o uso deste argumento por aquela Corte de juízes (e nem vou entrar no mérito da integridade moral de alguns deles ali que dá até vontade de vomitar). A minha irritação aumenta quando eles citam Carlos Drummond de Andrade, Manoel de barros e outros grandes escritores e poetas que um dia exerceram o jornalismo, sem terem cursado uma faculdade.
Primeiro que eu imagino que o Drummond não fazia matéria de polícia ou buraco de rua. Se fazia, transformava em crônicas. O problema é que esses grandes talentos do mundo das letras são exceções. E, se existem as exceções, qual é o problema de esses iluminados irem para uma faculdade de jornalismo obter um diploma para ter o devido registro profissional, se eles quiserem trabalhar como repórter, editor ou outra função de jornalista?
Mesmo que uma pessoa extremamente talentosa chegue à redação, ela não sabe fazer jornalismo, pode até ter um ótimo texto, mas vai ter que aprender como é o jornalismo. E hoje em dia, qualquer repórter sabe, é praticamente impossível, contar com a ajuda do editor ou do colega do lado para aprender o jornalismo. Ah, vai aprender na prática, mas vai errar muito até aprender. Se ele passar por uma faculdade antes, com certeza, isso fica mais fácil.
E, na minha opinião, entre os que comemoram a decisão do STF há mais semi-letrados que não querem fazer faculdade e nunca devem ter lido um livro do que os virtuoses.
Se há 40 anos já era exigido o diploma, como pode a sociedade acreditar que agora, sem diploma, o jornalismo vai ficar melhor porque alcançamos a "liberdade". Está garantido o livre acesso de analfabetos, semi-analfabetos e todos à profissão de jornalismo. Nossa, que conquista, hein?
O Aguinaldo eu sei que defende a formação autodidata para qualquer profissão. Ora, em que país estamos? Somos um país que lê pouco, muito pouco, que as escolas já são fracas, e ele quer contar com a boa vontade e o desempenho individual? Se for na linha do raciocínio dele, essa abertura então deveria acontecer com todas as profissões, e não apenas com o jornalismo. Aquela Corte acataria a sugestão para os advogados?
Ah, mas então a minha defesa é corporativista? É, também é. Os salários pagos aos jornalistas são vergonhosos. Sem a obrigatoriedade do diploma, a tendência é piorar. Afinal, se eu vou contratar um profissional de nível médio ou até fundamental (como bem lembrou o ministro Marco Aurélio), o salário será mais baixo. Para que isso não acontece, os sindicatos terão que se fortalecer muito - isso significa a categoria se mobilizar.
O Paulo defende que um curso técnico daria conta de formar jornalistas. Mas jornalismo não é só técnica. Há outras áreas que complementam a formação. Como alguém pode imaginar que uma pessoa que não passou pela faculdade tenha as mesmas condições de trabalhar do que outra que tenha passado por essa formação, que tenha participado de discussões e debates dentro de uma faculdade, tenha recebido aula de ética?
Parece piada...