
Em janeiro, estive em Santo Antônio da Platina. Fui a trabalho. E me lembrei de quando morei naquela cidadezinha. Era final da década de 80. Eu era recém-formada. Eu sempre soube que meu negócio era jornal impresso, mas o salário era duas vezes maior do que eu estava recebendo e topei a parada.
A TV mantinha uma secretária, eu como repórter, um cinegrafista, um operador de câmara e um motorista. Bons tempos aqueles. Eu morava num hotelzinho no “calçadão” da cidade. Depois do trabalho, nós íamos jogar sinuca nos bares da cidade. De noite, eu jogava baralho com os hóspedes do hotel. Eram viajantes. Eu era bem relacionada.
Foi lá também a primeira vez em que pisei em um campo de futebol. Fui cobrir um jogo do campeonato paranaense. Eu avisei o cinegrafista da minha ignorância sobre o tema. Ele prometeu me ajudar.
A cada lance importante, ele me avisava e eu anotava a jogada, o número do jogador e o momento em que havia ocorrido o fato. E assim passou o tempo. Mais precisamente, assim se passaram dois tempos de 45 minutos além do intervalo.
Findo o jogo, eu teria que gravar um texto para que o material fosse enviado para Londrina. O cinegrafista perguntou: Como foi o primeiro lance? Bem, o jogador havia cobrado uma falta e a bola tinha batido na trave. Aí ele quis saber o impossível: Mas como foi a falta? Eu não tinha resposta.
O cinegrafista era um cara legal. Com paciência, resolveu pedir ajuda para um radialista. Lá veio um rapaz, também cheio de boa vontade, para colaborar com a matéria. E tascou: A bola cruzou o segundo pau e... Antes que ele terminasse, eu já não conseguia mais prestar atenção.
Eu não fazia a menor idéia do que poderia ser um pau dentro de um campo, imagine, então, dois paus? Fiquei apavorada e comecei a chorar. Literalmente. E disse pro cinegrafista: Eu não vou fazer esse texto. Você manda as imagens sem texto. Eles podem me demitir, mas este texto eu não faço.
Eles não me demitiram e eu tive que cobrir todos os jogos do campeonato paranaense que foram realizados naquele ano no Norte Velho. É claro que eu torcia bravamente para que todos os times daquela região fossem desclassificados. O Platinense caiu fora logo; depois foi a vez do Matsubara, de Cambará; mas, a despeito da minha torcida, o União de Bandeirantes foi para a final contra o Coritiba. E eu tive que cobrir todos os jogos realizados em Bandeirantes.
Como cobrir futebol, sem entender do assuntoCobrir um campeonato de futebol não significa apenas ir aos estádios em dias de jogo. É preciso também fazer matéria sobre os treinos. E isso não é tudo.
Há ainda o coletivo-apronto: o último treino antes do jogo. Ali, um repórter fica sabendo quem provavelmente vai ser escalado para a partida e, se for esperto, qual será o esquema tático do time. Quando você pensa que acabou, você ainda pode ser pautada para entrevistar o técnico do time fora do campo.
Como é que eu, que até hoje não sei nada sobre esquema tático, poderia ser capaz de fazer apenas uma perguntinha para um técnico? A saída foi contar com um assessor.
Um radialista aposentado, muito gente fina, o Dorico, se dispôs a me ajudar quando a pauta fosse futebol.
Ele amava futebol e ia conosco a todos os treinos, coletivo-apronto, jogos e entrevistas. Me ajudava nos textos e soprava as perguntas que eu tinha que fazer. Uma vez um técnico até elogiou: Você está aprendendo, hein?
O Dorico já morreu. Eu continuo sem entender de futebol. E quando vejo uma repórter mulher cobrindo futebol na tevê eu me pergunto: Como é que ela consegue?