sexta-feira, outubro 29

Quinzinho ou JR?

As primeiras eleições de que tenho memória foram as de 1972, para prefeito. Eu tinha seis anos de idade. Estava brincando no quarto, quando fui interrompida por uma pesquisa eleitoral Ibope-Lucila-Luciana, com sete e cinco anos.
– Você é Quinzinho ou JR? – me perguntaram
– O que é isso? – devolvi.
– Você tem que escolher, Quinzinho ou JR?
– Quinzinho – chutei.
Aí, elas riram muito e tiraram sarro de mim:
– A Carina é Quinzinho... A Carina é Quinzinho...
Em seguida, elas revelaram que eram JR e mostraram folhetos com a propaganda do candidato delas.
Imediatamente eu mudei meu voto. Eu também era JR. Com aqueles cabos-eleitorais, jamais o Quinzinho receberia um voto meu.
E foi assim que eu descobri que havia eleições e que havia prefeitos. Imagino que o JR, o médico José Ribeiro, fosse do MDB, e o Quinzinho Camargo, da Arena. Preciso me informar sobre quem ganhou aquelas eleições. Imagino que tenha sido o Quinzinho Camargo porque sei que ele foi prefeito de Piraju. José Ribeiro também foi prefeito, mais de uma vez, mas aí eu era mais velha.

Dois anos depois, em 1974, eu tinha então oito anos, e me lembro de que o Quércia era candidato ao Senado pelo MDB. E o candidato da Arena era o Carvalho Pinto. De manhã, na escola, ficamos sabendo que haveria um comício do Quércia em frente à Igreja. Os meus colegas contaram que os pais iam votar no Quércia. O meu pai ia votar no Carvalho Pinto. Bem, ele era funcionário público, o Carvalho Pinto havia sido governador e nós vivíamos ainda na ditadura militar. Imagino que meu pai não ia declarar se fosse votar na oposição.

Só sei que eu fui ao comício do Quércia e o achei lindo (argh!!). Em comparação com o Carvalho Pinto ele era realmente um pão (adjetivo mais apropriado para aquela época). E o meu candidato derrotou a Arena – foi uma das primeiras derrotas do regime militar nas urnas.

quarta-feira, outubro 27

Malacacheta

Enquanto isso, em Malacacheta (MG), uma mulher colocou veneno no café do marido por ter apanhado dele. Tá certo que ele merecia uma malacachetada, mas veneno mata, né? Poderia ter sido uma malacachetada mais leve. Ela poderia ter feito as malas (cachetas) e ter ido embora. Deixasse o homem malacachetando sozinho. Agora, ela vai dizer o quê pra polícia? Que as malacachetadas do marido encheram as malacachetas dela e ela não pensou direito? Acho que ela já se arrependou porque foi ela quem levou o homem para o pronto socorro quando ele começou a passar mal. Quem sabe agora tudo se resolve. Ele pensa direito e para de malacachetar a mulher. Há malacachetas que vem para o bemacachetas...

segunda-feira, outubro 25

As minhas vizinhas

Se existe anjo da guarda o meu tem sido generoso na escolha de minhas vizinhas. A primeira delas com mais de 70 anos foi a dona Odila. Viúva, morava sozinha. Éramos ela, o Ní e eu no último andar de um predinho, aqueles de quatro andares, sem elevador. Quando ela queria falar comigo, era bom ser rápida porque ela não tirava o dedo da campainha enquanto eu não a atendesse. Pelo menos eu já sabia que ela era e não me assustava mais.

O Ní tinha quatro-cinco anos e ela sempre tinha balas reservadas para ele. E avisava que não era para ele mostrar para as outras crianças do prédio. Quando fazia bolinhos, também gastava a campainha para nos chamar. O supermercado Jumbo-Eletro já não existia fazia tempo, mas ela ainda dizia que ia ao Jumbo para se referir ao supermercado perto de casa.

Nos últimos meses de sua vida, dona Odila estava fraquinha. Não saía mais da cama e tinha os cuidados de duas enfermeiras. Percebi que o caso era grave quando ela desceu de maca na primeira de suas internações. Fui ao seu velório. Finalmente ela ia se encontrar com seu finado marido, a quem sempre pedia para vir buscá-la. Uma vez ela me contou que perguntou ao padre se era pecado querer morrer. Ela tinha muitas saudades do marido, e até passou a vê-lo pela janela.

O apartamento ao lado ficou vazio e eu logo depois de mudei para outras bandas. Agora a vizinha era dona Iva, também viúva e mãe da minha amiga jornalista Karen. Quando havia festas familiares, nós éramos bem-vindos, e o Ní corria para lá nas noites em que eu saía para dar aulas. Ficavam os dois vendo tevê. Foi uma convivência curta porque logo eu também me mudei e fui para bem longe. E também senti saudades das coisas gostosas feitas pela dona Iva.

No meu retorno do cerrado, assim que me mudei fui saudada por outra vizinha, a dona Gilda, de 72 anos, que era separada do marido. Ela era enérgica, mas não menos generosa. Tinhas uns netinhos fofos que apareciam por lá. E dona Gilda me socorreu algumas vezes, com um aspersor de veneno, para matar as baratas que me aterrorizavam.

Depois de um intervalo de quase três anos, novamente sou agraciada por outro desses anjos. Agora é a dona Faryd, 81 anos, viúva e sem filhos. Mas a vida dela é agitadinha. É tia de muitos sobrinhos que a querem muito bem e fazem o papel de filhos. Talvez porque ela tenha feito o papel de mãe para eles.

Logo no dia da minha mudança, dona Faryd apareceu com água fresquinha para os rapazes que carregavam os móveis. Doce e acolhedora, ela já me ofereceu café quentinho e pão com manteiga muitas vezes. E eu gosto muito de ouvir as histórias que ela conta de seus pais, irmãos e do marido. Ela é muito alegre, risonha e prestativa.

Outro dia, fez questão que eu conhecesse sua irmã, Laura, de 91 anos, muito bonita, de olhos azuis e também muito sorridente. Cúmplices, elas riam a todo momento lembrando as histórias de infância e juventude.

Como a minha velhice também vai chegar, gosto de ter por perto essas vizinhas que me servem de inspiração.

(Ilustração de Mariana, publicada no blog ttp://manasedesenhos.blogspot.com/2007_08_01_archive.html)

terça-feira, outubro 19

Os meninos, o futebol e as meninas

Só sendo mãe de um filho menino homem para, na minha vida, eu assistir a um jogo de futebol americano. Não vou exagerar: assistir trechos muito esparsos de futebol americano. O comentarista pelo menos é engraçadinho na sua fala. Enquanto eu assistia, eu pensava (eu assisto sem me concentrar muito): o que as meninas mulheres poderiam estar assistindo na tevê? Perguntei então para o Ní o que as amigas dele assistem na tevê. Ele achou minha dúvida pertinente porque também não tinha resposta. Aos 16, as meninas não veem mais Superpoderosas nem High School Musical – que isso eu sei que são as de cinco anos que veem. Malhação não vale como resposta porque no horário do futebol americano não passa Malhação. Eu acho que as meninas estão estudando enquanto os meninos veem futebol e é por isso que elas são melhores alunas do que eles.

segunda-feira, outubro 18

Nossas prisões

Eu mais não li do que li nesta vida. Portanto, é muito fácil ser surpreendida por uma boa leitura. No mês passado, terminei o livro O Prisioneiro, de Érico Veríssimo, que estava esquecido na minha estante. A princípio, fiquei temerosa de que ele usasse uma linguagem difícil. Mas o livro é muito bom. Embora ele não dê os nomes, a história se passa na Guerra do Vietnan. São vários personagens, vítimas da guerra – os que estão do lado do dominador e os que estão sendo massacrados. E cada um carrega uma guerra interna, um conflito que o torna prisioneiro e do qual não consegue se libertar.

Veríssimo mergulha fundo na essência de cada personagem. Mostra como os militares americanos sofrem com seus dramas pessoais, e o tanto de sofrimento que causam nos nativos. Embora no final nos deparamos com O Prisioneiro, há muitos prisioneiros ao longo da história. Além da crítica que faz à guerra, Veríssimo nos faz pensar em nossas próprias prisões.

Poesia da mínima coisa

Mayumi Takahashi

No mínimo quero-te ao lado
Em passos curtos e leves
De mãos estendidas
à outra mão mutilada
Que a ansiedade fatia
pela pressa de viver.

No mínimo
quero a resistência dos bravos
A franqueza
e sinceridade dos derrotados
O vermelho de luta jamais esquecido.

No mínimo
A coisa é mínima.
E para além do mínimo
A urgência do delírio.
__________________________________________

(*) Mayumi Takahashi é professora do ensino fundamental em Foz do Iguaçu.

Peguei a poesia do site Guatá, do meu amigo e jornalista Sílvio Campana.

domingo, outubro 17

Tropa de Elite2

Eu já tinha gostado de Tropa de Elite, o primeiro. E hoje à tarde assisti o número dois. Gostei mais. No primeiro, muita gente achou que fosse apologia à violência da polícia. Eu não achei. Achei que era uma crítica. Agora, o Padilha "desenhou" e foi bastante explícito nessa crítica. Mas que dá medo, dá! Muito medo da polícia. É muita bandidagem! Os policiais querendo se livrar dos traficantes para eles poderem mandar! É o fim!
No Estadão de domingo, tem uma crítica de Luiz Zanin Oricchio. Não sei se o texto do blog dele é o mesmo publicado no jornal.

quinta-feira, outubro 7

A liberdade de expressão

No sábado, eu li a coluna da Maria Rita Kehl no Estadão e gostei muito. Acho que ela matou a pau as críticas que fazem aos programas sociais do governo. E hoje leio que ela perdeu o espaço que tinha no jornal justamente por manifestar sua opinião, que é diferente da do jornal. Ué, não é o governo Lula que é contra a liberdade de expressão? Ué, não cassaram a obrigatoriedade do diploma dos jornalistas porque o diploma representava o fim do direito da livre expressão? Esse fato só deixa mais claro aquilo que todos sabemos: a grande mídia defende a liberdade de expressão desde que essa expressão seja exatamente sobre o que ela pensa... Se alguém pensa diferente ou questiona o conteúdo dessa mídia é censura... Aqui, a entrevista da Maria Rita Kehl sobre sua demissão. E a tentativa do Estadão de se justificar...

O domingo

Inocente útil
Eu não votei no domingo porque estava viajando. Para presidente, meu voto iria para o Plínio de Arruda Sampaio. Eu não boto muita fé (já que a fé é o grande diferencial entre candidatos) na Marina Silva, assim como não acredito no Fernando Gabeira nem na Soninha Francine, e nem no PV. Eu imagino que a Marina saiba que o oba-oba que a grande mídia fez em torno da “onda verde” só aconteceu porque foi ela quem permitiu que o preferidinho da grande mídia, o Serra, fosse para o segundo turno. Se a Marina estivesse na posição da Dilma, ou seja, com condições de vencer o Serra, seria tão metralhada quanto a petista pela Veja, Estadão, Folha de S. Paulo e afins.

* *
Paulo Ubiratan
Em função da minha viagem, também não pude me despedir do jornalista Paulo Ubiratan. No domingo, na casa de um amigo, foi ele quem me disse ter ouvido no rádio sobre a morte de alguém da CBN de Londrina. Eu sabia que o Paulo estava na UTI, portanto, deduzi que era ele. No início de setembro, eu e a Benê fizemos uma visita ao Paulo que ainda estava em casa. Apesar de bastante debilitado, era o mesmo Paulo Ubiratan de sempre. Bravo, muito bravo, com sua doença. E ao mesmo tempo brincalhão.

No lançamento do livro dele, em dezembro de 2007, eu brinquei: - Sei não, hein, Paulo, gaúcho escrevendo poesia...Também fui à Câmara quando ele recebeu o título de cidadão honorário de Londrina. Ainda bem que pude compartilhar com ele esses momentos de alegria. E gostaria muito de ter ido ao seu velório no domingo.

Nos tempos de redação da Folha de Londrina, ele gostava de me provocar (o Nícolas ainda era pequeno): - Deixa comigo esse guri! Quando ele for maior, eu o levo pra conhecer as primas!
Eu respondia, brava: - Fique longe dele!!

Vou deixar o link pro texto que a Elsinha escreveu sobre o nosso amigo, e que foi publicado na Folha de Londrina de segunda e vale a pena ser lido.

quarta-feira, outubro 6

A caça nossa de cada dia!

Quando os homens viviam nas cavernas, o rango era garantido com a caça de algum animal. Com a agricultura, pecuária, geladeira, fogão e utensílios domésticos, ficou mais fácil se alimentar. Mas a caçada agora é outra. Caça ao dinheiro. Afinal, tudo custa dinheiro. E acho que eu sou mesmo comunista no coração. Porque eu acho o seguinte: seja lá no que você trabalha, todo dia você deveria ter direito a uma alimentação digna, à louça lavada e guardada, a uma sonequinha depois do almoço, sem distinção. Ou seja, todo mundo poderia comer o que quisesse sem se preocupar com o custo. Porque o simples fato de trabalhar lhe daria esse direito, fosse você um lixeiro ou um médico. Ah, mas são responsabilidades diferentes. Pois é, mas a sociedade precisa de todos os serviços e você pode escolher o que vai fazer – e eu duvido que quem quer ser médico ia escolher uma profissão mais fácil só porque ser médico não lhe garante ter mais direitos do que outro. Será que isso é papo de jornalista pobre?

segunda-feira, outubro 4

As mãos

Depois que desliguei o telefone percebi que, para ele, tanto fazia me ver ou não me ver, me ter ou não me ter, me agradar ou me desagradar. E fiquei com vergonha. Se tivesse alguém por perto, veria minhas faces vermelhas.

Então decidi ligar mais uma vez para desmarcar o encontro recém-marcado. Afinal, era preciso ter um pouco de dignidade. Me senti aliviada. E resolvi soltar minhas mãos das mãos dele. Pensei que se elas ainda estavam juntas era porque eu estava segurando as dele. E no dia seguinte eu senti que as minhas mãos estavam mais geladas do que sempre.